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De enchentes à “onda” da Copa do Mundo, comerciantes resistem ao tempo no Shopping Popular

22 Abr 2019 - 18:00

De enchentes à “onda” da Copa do Mundo, comerciantes resistem ao tempo no Shopping Popular
Horminda de Barros Monteiro. Esqueçam o nome completo. A partir de agora, podem chamá-la de dona Horminda, 76. Melhor ainda: conheçam sua filha, Laurinha Monteiro, 50. É pelo nome dela que ficou conhecida a comerciante. Foi assim que ela construiu – anonimamente – uma saga de resistência. Ouvir Horminda é como viajar no tempo. Mesmo que não conheça a Cuiabá de 24 anos atrás, é bom embarcar nesse barco e deixá-la conduzir o destino rumo ao Shopping Popular.

Nascida e criada na travessa do Porto, dona Horminda fez das águas do rio que banha a capital mato-grossense um grande manancial de sua vida pessoal e profissional. “Quando era jovem, atravessava o rio à nado. Bebia sua água. Lavava roupa ali. Era bom demais. Minha mãe levantava de madrugada para fazer café e vender na região. Nós ajudávamos ela. Depois, adulta, comecei a vender produtos na feira da praça dali”, relembra com um sorriso tímido e o semblante saudoso.

No entanto, o que era um sinal de prosperidade, tornou-se ponto de partida de uma longa jornada na década de 1990. Dona Horminda conta que, certo dia, por conta de uma reforma, os comerciantes instalados na feira foram realocados para um terreno próximo. “Falaram que nós iríamos voltar para a praça. Enganaram a gente. Não nos deixaram voltar. Na mesma data, retiraram os comerciantes do centro da cidade sob escolta policial. Quem não concordava, saia na marra”, comenta.

Eis que no dia 21 de abril de 1995 surge um possível porto seguro. Localizado entre as avenidas Tenente Coronel Duarte (Prainha) e Carmindo de Campos, o espaço – até então abandonado – apresentava uma área que, no futuro, viria a se tornar o Shopping Popular. “Chegamos e não tinha nenhuma estrutura. Muito menos, teto. Era só mato. Um terreno que ninguém usava. O Complexo Poliesportivo Dom Aquino, que o cercava, tinha espaços alagados. Era um grande esconderijo de bandidos”, explica a filha.

Laurinha, que trabalha com a mãe e acompanhou de perto a transição, destaca que o início dessa trajetória foi muito difícil. “Não tinha movimento ali. Muitos desistiram. Pagávamos alvará, mas só uma marcação no chão batido delimitava nosso espaço. Sem estrutura, tampávamos nosso campo de sol com lonas. As pessoas achavam que se tratava do Movimento Sem Terra. Logo, a gente passou a se perguntar sobre o que poderia ser feito para melhorar o local”, ressalta.

SUOR E LÁGRIMAS – Nem o calor cuiabano foi capaz de atrapalhar a determinação dos comerciantes. “Começamos a nos organizar, tendo na figura do Misael Galvão uma liderança. A primeira coisa que fizemos foi investir em segurança. Derrubamos a mata. Aterramos a área alagada do Complexo, que passou a ser mais frequentado. Nesse período, fazíamos feiras aos finais de semanas em outros bairros para sobreviver. Demorou para nos enxergarem de outra forma”, cita Laurinha.

Quase um ano após a instalação do comércio no local, uma enchente – praticamente – levou por terra os sonhos dos trabalhadores. “Nossas barraquinhas eram de metal e lona. Com a chuva, a água invadiu tudo e o pessoal que ficava nas pontas perdeu toda a mercadoria. Saímos em passeata caminhando até a Prefeitura para pedir ajuda – desentupir o esgoto. Lá, não fomos recebidos. Voltamos, mas continuamos insistindo com eles até que viram que não desistiríamos”, sinaliza.

Dona Horminda complementa que a partir daí a gestão municipal se aproximou. “A princípio, disseram que a gente atrapalhava o Complexo. Ao ponto em que nós, associados, assumimos a responsabilidade de reformar o Dom Aquino e dar continuidade nesse trabalho. Também foi acordado que o shopping pagaria metade da parcela da nova estrutura de cobertura (teto) para a construtora responsável. Mas, quando chegou a segunda parte, tivemos que assumir a dívida”, assinala.

NOVOS DESAFIOS – Quase dez anos depois, com a proximidade da Copa do Mundo no Brasil em 2014, uma nova onda tentou atingir o Shopping Popular. “Disseram que a nossa estrutura estava fora do padrão ‘FIFA’. Após um trabalho próximo ao Poder Público, a prefeitura abriu uma concessão onerosa de 30 anos da área. Para tal, teríamos que reestruturar o shopping e nos comprometer a restaurar o Complexo. Só nos restou cumprir”, relembra Laurinha.

A comerciante reforça que uma crise econômico-financeira assolava o país. “Faltava emprego. Boa parte do pessoal antigo desistiu. Mais uma vez nos desdobramos para bancar a obra – que, a princípio, duraria um ano e três meses, mas durou dois anos. Muitos que estavam bem estruturados ali quebraram. Venderam o ponto de graça. Havia uma construção onde é o shopping e outra no Complexo. Nós, ficávamos no meio – entre a poeira e o calor. O público sumiu”, comenta.

Em 2015, o novo Shopping Popular – cuja obra custou R$27 milhões – foi inaugurado em Cuiabá. Trata-se de um espaço climatizado, com corredores mais amplos, dois andares e que – além de ser um centro comercial, de serviços e de cultura – apresenta uma fachada especial em homenagem às construções antigas da região. Apesar da ampliação de 400 para mais de 500 pontos comerciais, Dona Horminda e Laurinha reiteram que a luta continua.

“Toda exigência ou meta que surgiu em nosso caminho, nós superamos. Elas nos fortalecem e nos colocaram cada vez mais dentro da lei. Hoje, somos microempreendedores respeitados pela sociedade e pelo Poder Público. Inclusive, originamos o movimento que levou o Governo Federal a sancionar em 2009 a Lei 11.898, a Lei dos Sacoleiros. Se hoje o Shopping Popular existe, é por causa do suor e dedicação daqueles que por aqui permaneceram”, pondera Laurinha.

Por Assessoria Shopping Popular

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